quarta-feira, 1 de setembro de 2010

O Cangaceiro - 1970 -

Ao contrário do que eu havia presumido inicialmente não estamos aqui diante de uma refilmagem do clássico brasileiro do diretor Lima Barreto que tem o mesmo título. Estamos diante de uma obra ítalo-espanhola e com história diferente. Curiosamente a contracapa de uma edicao européia do dvd assinala que trata-se uma refilmagem. Nada a ver. Este filme que abordo aqui é um híbrido de gêneros que só o cinema italiano popular dos anos 60/70 era capaz de produzir. E aqui temos um filme de cangaceiros, como o título obviamente mostra, com elementos de western spaghetti, que naquele ano – 1970 – vivia sua fase de ouro. Filmado com certeza aqui no Brasil e , curioso , praticamente não tem ninguem daqui no elenco ou na equipe técnica, à excecao de uma espantosa e inusitada figuracão que por si só já tornaria o filme digno de nota : Baby Consuelo, a Baby do Brasil, entao vocalista dos Novos Baianos, fazendo uma ponta logo no ínicio do filme. Singular. filme de Giovanni Fago, diretor italiano obscuro e tambem um dos roteiristas do filme, ao lado do espanhol José Luiz Jerez Aloza, comeca com a trama clássica das histórias de cangaco: a vinganca. Espedito , quando tem ínicio a história , é um sertanejo simples, que após ver seu pai e sua vaca serem mortos pelos volantes, decide buscar sua vendetta. E faz questão de dizer que busca a vinganca porque mataram ..sua vaca. Hilário e bizarro. Salvo e curado por um ermitão, com tracos típicos dos beatos nordestinos, o rapaz se transforma numa espécie de andarilho místico pregando pela caatinga. Logo percebe, no entanto, que este não seria o melhor caminho e forma seu bando de cangaceiros. Thomas Milian, um ator de renome e atuante ate hoje, tem uma interpretacão a meio caminho entre o cômico e absurdo , que lembra Johnny Depp como o pirata maluco de “Piratas do caribe”. A questão política nordestina serve como pano de fundo da história. A exploracão do petroleo é a principal motivacão dos poderosos para massacrarem os cangaceiros e os camponeses. Sem dúvida o diretor buscou aqui inspiracao nos filmes de cangaco realizados por Glauber Rocha nos anos 60 e que tinham Antônio das Mortes, como personagem principal. Todo o filme tem uma aura quase surreal e barroca, involuntária as vezes. Sem dúvida, é o filme mais bizarro já feito sobre os bandoleiros nordestinos, aparte nosso nacional “Kung Fu Contra as Bonecas” (mas neste caso tratava-se uma comédia ) . Imaginem sò: em umas das sequências o bando de cangaceiro enfrenta gangsters americanos, trazidos da América, com metralhadoras e tudo ! Surreal ate a médula. Em outra sequência igualmente quase absurda , os camponeses de uma vila, desmontam o carro de um engenheiro e só deixam do mesmo a carcassa…. Outra sequência de destaque é a do baile oferecido pelo governador sacana aos cangaceiros: o jantar que comeca pomposo, ao som de uma orquestra tocando sonatas e valsas , termina com um forró alucinado, com serventes, cangaceiros, madames e o escambau , dançando pelo salão ao som da mesma orquestra agora envenenada com zamumbas e tambores. Até o arcebispo é flagrado batendo os pezinhos ao som do forró. Por um instante vislumbrei toques bunuelianos. Involuntário e insano. Só uma arte popular como o cinema permite este crossover entre popular e, digamos assim, erudito.Não pude averiguar com seguranca se este filme foi exibido no Brasil na época. Provavelmente não, haja vista o fundo político espinhoso para a entao ditadura militar. Comparado aos nossos filmes de cangaceiros que tambem viviam seu auge, esta obra estrangeira não faz feio, apesar da infelidade histórica e anacronismos. Nossos filmes do ciclo do cangaco tambem raramente primaram pela fidelidade. Com raras excecões tivemos faroestes disfarcados de filmes de cangaco. Troque as vestimentas e a trilha sonora e teremos um western como outro qualquer. O filme não é uma obra-prima do cinema: - trata-se uma obra cinematográfica dentro dos padrões do cinema italiano popular dos anos 70 e que agora estao sendo revalorizados e apreciados gracas aos blogs e cineastas como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez , entre outros. Mas é um um fime digno de ser visto.
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Um comentário:

marcos disse...

Este Western caboclo quando batizado no Brasil,chamou-se:"A Rebelião dos Brutos".O ator cubano,naturalizado americano,estudou no Actor's Studio de Nova Iorque.Tem em seu currículo dois filmes considerados pela crítica:"La Luna"(79),de Bertolucci e "Identificação de Uma Mulher"(82),de Antonioni.Mas sua melhor performace foram nos Western Made In Italy,com personagens de mexicano-fóra-da lei.